A dada altura da minha vida comecei a ter dúvidas sobre o nível onde me deveria posicionar socialmente. Por esse motivo decidi consultar a minha mãe, que era quem eu achava a pessoa mais indicada para me esclarecer. Por isso fui ter com ela e fiz a pergunta:
- Mãe! Nós somos pobres ou somos ricos?
- Nem uma coisa nem outra - respondeu-me ela - somos remediados.
- Remediados???!!!
Para mim, aquela palavra soava-me a "alguém que toma muitos remédios", pelo que tive que solicitar esclarecimentos complementares. Então a minha mãe explicou-me que remediada era uma pessoa que não passava fome mas que também não podia comer lagosta todos os dias. Por outras palavras, era a forma salazarenta de designar a actual classe média.
Por um lado fiquei aliviada. A hipótese remota de me ser revelado que era pobre causava-me, confesso, alguma angústia. Apesar de todos os livros da escola ensinarem que não havia melhor coisa na vida do que a pobreza, algo no meu íntimo me dizia que isso era aldrabice.
Por outro lado, fiquei um pouco decepcionada, pois ainda tinha no fundo alguma esperança de descobrir que era rica. Pelo menos era uma das únicas quatro crianças da escola em cuja casa havia um frigorífico, uma televisão e uma máquina de lavar roupa. Já para não falar na casa de banho completa com água quente corrente.
O Tempo Entre Costuras
Há 4 semanas
9 comentários:
Eras a mais rica de todas :)
Portanto, em termos relativos era rica!
E aquela que eu ouvia na catequese -
" É mais fácil entrar um camelo
pelo fundo de uma agulha que um rico no reino de Deus", assustava-me, não que eu fosse rica, mas que tinha vontade de ser tinha !!!!
Essa do camelo foi um mistério para mim, até me explicarem que a tradução estava mal feita e não era camelo mas sim corda. O que é estúpido na mesma!
Ehehehh!!
Eu não tive essa sorte, percebi por conta própria e talvez um pouco mais tarde; os Açores ficavam muito longe....
É mesmo!! A expressão «remediado» (que felizmente desapareceu da nossa linguagem) era mesmo salazarenta!
E dá para associar a 'remédio', de facto. É a tal coisa do «para desconto dos nossos pecados», um pouco na mesma linha - temos de ser conformados com aquilo que temos.
Pois...
Luxos é o que é. Ou era.
A Sr.ª D. Castanha era sim uma grandessíssima porca capitalista! Água quente?!?! Sem ser da panela?!?! E a minha avó convencida que era das ricas porque sempre sobrava a comida e tinha uns belíssimos bois.
V/ Ex.ª estava num escalão bem superior.
Emiele, e a história da Maria da Várzea, lembras-te?
Pois Kruzes, habituei-me mal, foi o que foi.
Taralhoca, já eu em compensação, bois era só os que via passar na rua.
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